31 janeiro 2005

Encerramento da Pousada de Juventude de Évora

Soube-se nas últimas semanas que a Pousada de Juventude de Évora, encerrada desde 2003 para obras de remodelação, vai deixar de existir como tal, para passar a albergar as crianças e jovens integradas na Casa Pia de Évora até agora alojadas no Convento de S. Bento de Castris. A propósito deste anunciado encerramento, e enquanto profissional de Animação Sociocultural, que tem vindo a trabalhar na área da juventude, pretendo exprimir a minha opinião, essencialmente técnica, sobre uma decisão que não posso deixar de classificar como profundamente negativa.

Não me posso pronunciar, porque não disponho de informação técnica suficiente, sobre se a anunciada transferência das crianças e jovens da Casa Pia de Évora, de S. Bento de Castris para as instalações da Pousada de Juventude, em pleno centro histórico de Évora, poderá ser efectivamente positivo para elas. Com efeito, não conheço nenhuma opinião técnica, devidamente fundamentada, a propósito desta transferência, designadamente que demonstre que as novas instalações possuem as condições desejáveis para o funcionamento de uma instituição de acolhimento de jovens em situação de risco de exclusão. Sei, pelo que apareceu escrito num órgão de comunicação social de âmbito nacional, que um responsável político local considera esta transferência como «um factor muito positivo, uma vez que facilitará a sua integração física e social na cidade». É, portanto, provável que esteja a ser desenvolvido pelos técnicos que trabalham naquela instituição um trabalho de educação social com vista a garantir que a par da integração física, naturalmente inevitável, ocorra essa desejável integração social das crianças e jovens ali institucionalizados. Porque, e enquanto técnico, parece-me indispensável que a transferência das crianças e jovens seja antecedida por um profundo trabalho de educação social direccionado para as crianças e jovens da instituição e para a comunidade onde vão ser inseridos de modo a potenciar os efeitos integradores e, sobretudo, a evitar riscos de se originarem situações susceptíveis de contribuir para acentuar a sua exclusão e segregação social.

Mas, e ainda que tudo seja feito de modo a que a transferência dos utentes da casa Pia de Évora contribua, como todos desejamos, para melhorar o seu bem estar, a solução encontrada tem um custo que me parece excessivo – o encerramento da Pousada de Juventude de Évora. Para se perceber a importância da existência desta estrutura na cidade de Évora e a dimensão dos danos que o seu encerramento causará importa começar por ter uma percepção sobre o papéis e funções que as Pousadas de Juventude desempenham.

As Pousadas de Juventude não são apenas unidades de alojamento que praticam preços reduzidos e que servem para promoverem o turismo entre os jovens. Ainda que só esta função já seja suficiente para justificar a necessidade de existência de uma Pousada de Juventude numa cidade e numa região que tem no turismo um dos factores mais importantes para o seu desenvolvimento. As Pousadas de Juventude, em Portugal e nas outras largas dezenas de países onde existem, são, antes de mais, um instrumento essencial na prossecução de políticas de fomento da mobilidade dos jovens. A Movijovem, uma cooperativa de interesse público constituída pelo Instituto Português da Juventude e pela Associação de Utentes das Pousadas de Juventude, a quem compete a gestão da rede de Pousadas de Juventude portuguesas tem, de acordo com os seus estatutos, “como objecto principal promover, apoiar e fomentar acções de mobilidade juvenil, na sua vertente social, possibilitando aos jovens portugueses, em especial aos mais desfavorecidos, um contacto mais directo com a realidade e o património cultural, histórico e natural do País”. Ora parece-nos por demais evidente que a prossecução de tal objectivo fica decerto diminuída com a não existência de uma Pousada de Juventude numa cidade conhecida, quer interna quer externamente, exactamente pelo seu património cultural e histórico.

A importância de prosseguir de um modo activo acções que promovam, enquadrem e facilitem a mobilidade dos jovens é hoje internacionalmente reconhecida pelas mais diversas instituições e por quase todos os que trabalham nestas áreas. Uma maior mobilidade dos jovens parece constituir um elemento chave na aquisição de autonomias, na aprendizagem intercultural e até, na entrada, no mercado de trabalho nomeadamente a nível internacional. A mobilidade, quer seja nacional, ou internacional, em contexto escolar ou não, constitui-se como instrumento de educação não-formal com potencialidades praticamente únicas de permitir que os jovens adquiram competências sociais que se mostram cada vez mais necessárias numa sociedade marcadamente global. Para além da mobilidade juvenil, e com ela as acções de intercâmbio e de aprendizagem intercultural, as Pousadas de Juventude são, também, infra-estruturas que facilitam o voluntariado dos jovens, designadamente o de âmbito internacional. São todas estas áreas do trabalho cultural, social e educativo com os jovens, e de entre estes os mais desfavorecidos, que são afectados pelo encerramento de uma Pousada de Juventude.

Naturalmente também as associações da cidade de Évora e da região que a envolve, e em especial as juvenis, são directamente afectadas com o encerramento da Pousada de Juventude de Évora uma vez que esta já era um instrumento essencial na promoção de iniciativas associativas dirigidas aos jovens da região nas mais variadas áreas. As actividades promovidas pelas associações nas vertentes da formação, da mobilidade, do intercâmbio e do voluntariado, quer nacional quer internacional, serão as mais afectadas já que os custos de alojamento e de alimentação sobem consideravelmente com o encerramento da Pousada de Juventude.

As razões aduzidas, e importa referir que outras poderiam ter sido acrescentadas, apontam, na nossa modesta opinião, para a necessidade de debater soluções que, sem prejudicar os interesses dos utentes da Casa Pia de Évora, salvaguardem a manutenção da Pousada de Juventude de Évora.

Estudo sobre a Juventude Portuguesa

No Portal da Juventude é feito o anúncio da divulgação, pelo Observatório da Juventude, de um estudo sobre os hábitos e comportamentos da juventude portuguesa. Este estudo, que pode integralmente ser consultado aqui, pela quantidade, diversidade e interesse da informação que disponibiliza merecerá, por certo, análises e comentários posteriores da nossa parte.

No início...


A intenção deste blogue é partilhar com aqueles que por aqui forem passando reflexões, opiniões e informações sobre temáticas relacionadas com a minha actividade profissional. Sou Animador Sociocultural e, enquanto tal, desenvolvo há duas décadas trabalho dirigido à juventude. Interesso-me de um modo particular com as questões relacionadas com o trabalho com jovens nas áreas do associativismo, dos tempos livres, do voluntariado, da mobilidade e do intercâmbio. Acredito plenamente que o o trabalho com jovens nestas áreas tem um enorme potencial social e educativo, o qual, infelizmente, está longe de ser aproveitado no nosso país. Ainda que modestamente espero que este blogue possa constituir-se como um contributo para a difusão e a reflexão em torno de ideias, conceitos, práticas e projectos relacionados com animação sociocultural e a juventude.