08 junho 2007

CAMPOS DE FÉRIAS EM PORTUGAL

Há números que, inevitavelmente, nos levam reflectir. De acordo com o Ministério da Juventude e dos Desportos de França, em 2004, foram organizados por entidades francesas 30.699 campos de férias (1) nos quais participaram 1 100 380 de crianças e jovens com idades compreendidas entre os 4 e os 18 anos (41% entre os 7 e os 12 anos e 57% entre os 13 e os 18 anos). A mesma fonte estima em cerca de 60.000 o número de indivíduos envolvidos como directores e animadores nessas actividades.

Mesmo descontando o facto de a população francesa ser seis vezes maior que a portuguesa, os números referidos são esclarecedores das diferenças que neste domínio, como em tantos outros, existem entre Portugal e França. Efectivamente, e ainda que os números disponíveis sejam escassos, não será difícil concluir que em Portugal os Campos de Férias, nomeadamente os residenciais, que implicam o alojamento dos participantes e que são os que verdadeiramente merecem tal designação, são uma realidade praticamente inexistente.

Serão certamente várias as razões que explicarão tais diferenças. Em primeiro lugar as razões históricas. Com efeito a expansão deste género de actividades pela Europa na década de 60, levada acabo fundamentalmente por acção do movimento associativo, não se reflectiu em Portugal em consequência do regime isolacionista e pouco favorável à liberdade de associação que então existia em Portugal. Na actualidade a debilidade das condições socio-económicas do país, das instituições que potencialmente poderiam promover e apoiar campos de férias e das famílias explicarão, pelo menos em parte, a reduzida dimensão destas actividades em Portugal.

Outra razão que não pode ser ignorada é o reduzido conhecimento das potencialidades dos campos de férias enquanto espaços educativos e, especialmente, do contributo que eles podem dar na formação integral e harmoniosa das crianças e dos jovens. A aquisição de competências sociais e o desenvolvimento da autonomia são, porventura, as áreas em que, de uma forma mais significativa, se pode observar o efeito educativo dos campos de férias sobre as crianças e jovens que neles participam.

As potencialidades educativas dos campos de férias, e uma vez mais estamos a referirmo-nos aos que decorrem em regime fechado ou residencial, resultam de um conjunto de características próprias destas actividades. O seu carácter intensivo, o regime fechado em que decorrem, as actividades que neles são desenvolvidas, a natureza, qualidade e intensidade das interacções pessoais que promovem fazem com que, habitualmente, as crianças e os jovens que participam em campos de férias os valorizem como actividades muito positivas. Isto é amplamente comprovado pelo facto de a maioria daqueles que neles participam uma primeira vez repetirem tal experiência em ocasiões posteriores.

À reduzida dimensão do Campos de Férias em Portugal não serão, também, alheios o enquadramento legislativo e a debilidade dos mecanismos de financiamento destas actividades.

Em relação ao enquadramento legislativo importa ter presente que apenas foi introduzido há 3 anos suprindo uma lacuna regulamentar de muitas décadas. No entanto, aqui como em outros sectores, o legislador optou por uma postura draconiana impondo aos organizadores o respeito de condições, especialmente ao nível das instalações, que dificilmente viabilizam a realização destas actividades na realidade portuguesa. Paradoxalmente continua por regulamentar em detalhe aquele que nos parece o aspecto mais crítico para garantir a qualidade e a segurança dos campos de férias – o factor humano. Com efeito a regulamentação da formação e da certificação dos animadores e dos responsáveis de Campos de Férias não está ainda completa.

Quanto ao financiamento importa referir que, em 2005, o programa “Férias em Movimento” do IPJ – Instituto Português da Juventude, destinado a financiar Campos de Férias, em regime residencial e não residencial, teve um custo global de quase 400 mil euros e que para o ano em curso a dotação do mesmo é de cerca de 860 mil euros. Importa, no entanto, esclarecer que desconhecemos a fatia desta verba afecta ao Campos de Férias residenciais, sendo nossa convicção que a maioria dos 536 campos apoiados por este programa, em 2005, foi não residencial (2). A exiguidade destas verbas para um programa de âmbito nacional compreender-se-á melhor se, por exemplo, tivermos em conta que só as Festas da Cidade de Lisboa, em 2007, têm um orçamento de 3 milhões de euros. As normas de financiamento dos campos residenciais por este programa que impõem um tecto máximo de custos de 18 euros por dia e por participante são, também, muito limitadoras se tivermos em conta que os organizadores têm de assegurar aos participantes alojamento, cinco refeições diárias e suportar os custos com pessoal de enquadramento, actividades e seguros, etc.

Neste contexto não é difícil compreender porque continuam os campos de férias em Portugal a ser uma realidade apenas acessível a um número muito reduzido de crianças e jovens, não obstante o seu enorme potencial sócio-educativo.

Ainda a propósito de Campos de Férias deixo aqui a informação que a APCC – Associação para a Promoção Cultural da Criança vai realizar em Junho e Julho, ao longo de quatro fins-de-semana, um Curso de Formação para Animadores de Campos de Férias. Os interessados podem obter informações adicionais pelo telefone 21 842 97 30.

(1) Os números reportam-se a actividades em regime residencial (pernoita dos participantes) com duração superior a 5 dias e onde são acolhidos pelo menos 12 menores. Fonte: MJDF
(2) Fontes: Relatório de Actividades 2005 e Plano de Actividades 2007 do IPJ in www.juventude.gov.pt.

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